São 4h da tarde. Dona
Olga, ex-contadora de descendência judia em seus 82 anos bem vividos, faz
compras no mercadinho que frequenta há mais anos do que consegue numerar. Seus
cabelos louros, recém tingidos e com um penteado feito exclusivamente para a
data especial, era motivo de orgulho naquele dia. Suas vestimentas, em
contrapartida, eram simples. Usava um vestido florido, que sempre vestia para
ir ao mercadinho, pois aquelas flores a faziam sentir-se em harminoa com aquela
natureza rica de frutas, vegetais, cores e texturas. Isso a deixava feliz e
tranquila. Contribuindo com essa tranquilidade, tocava Mozart no local; algo
que, ainda que inusitado para novos clientes, não espantava D. Olga. Ela
conhecia o gosto para música clássica do dono do estabelecimento, que sempre
colocava os grandes – Mozart, Chopin, Vivaldi – para seus clientes ouvirem,
algo que nunca pareceu incomodar ninguém. Dona Olga que o diga, pois estava
agora gesticulando com uma mão ao compasso da sinfonia, de frente para
compartimento de tomates, certificando-se de fazê-lo de forma discreta, pois
detestava ser o centro das atenções. Com a mão quieta apoiava a sacola com os
tomates que havia selecionado para o peixe ensopado do aniversário do filho,
Miguel, que completava 36 anos naquele dia.
Enquanto isso,
aproxima-se da seção dos tomates um homem muito elegante, que imediatamente
reconhece D. Olga. É Marcos Friedman, seu antigo colega de escritório. Era e é
um homem muito culto e possuidor de um grande fascínio em se vestir bem,
comprando sempre as roupas mais caras que seu orçamento permitia. No entanto, o
que lhe sobra de requinte, sobra também de humildade e extroversão. Marcos
coloca a mão no ombro de dona Olga e a cumprimenta.
– Olguinha! Quanto
tempo, Olguinha! Como você está? – pergunta o homem, muito entusiasmado.
– Não acredito! Marcos
Friedman! – replica Olga e aproxima-se para o abraçar.
– Quanto tempo faz?
Uns dez anos que não nos vemos? Talvez quinze? – o homem pergunta, ajeitando de
forma quase automática o smoking, que parecia novo em folha, após o
abraço caloroso.
– Olha, se minha
memória não me falha – coisa que ela tem feito bastante recentemente – a última
vez que nos vimos foi no seu casamento com a Bertinha. Há dez anos atrás – diz
ela, com um sorriso dos mais genuínos no rosto.
– Acho que você está
certa, Olguinha. Por falar nisso, a Berta sente bastante saudade de você; ela
ia adorar te ver aqui – nota Marcos, agora já com o chapéu estilo Trilby
nas mãos.
– Ah, quantas saudades
eu sinto da Bertinha, minha amiga. – ela diz, olhando para o chão, por um
momento – E agora que estou me lembrando. Vocês se conheceram através de mim,
não é verdade, Marcos? – ela pergunta, apenas esperando uma confirmação.
– Está certa novamente,
Olguinha – e sorri. – Se você não tivesse me levado à sinagoga Shel, lá
em Botafogo, naquele dia, eu nunca teria conhecido a Berta e construído a minha
família linda.
– Ah, eu sabia! – diz
e sorri D. Olga, apontando e chacoalhando o dedo para o homem.
– Pois é. Tenho três
netinhos, sabia? Dois meninos e uma menina. Lindos, todos lindos – o homem se
enche de orgulho ao dizer isso.
– Que maravilha! Você
tem alguma foto deles? – ela pergunta, a curiosidade à flor da pele.
– Tenho sim. Olha aqui
– diz Marcos, sacando do bolso o celular estilo flip. No entanto, descobre que
o aparelho está sem bateria.
– Numa outra
oportunidade você me mostra seus pequenos, Marcos. Acontece. – diz Olga,
consolando o homem.
– Que situação
desagradável. Eu tinha certeza que tinha carregado ele hoje de manhã – lamenta
ele.
– Sabe, Marcos. Eu
também tenho um netinho. Eduardo, o nome dele. Duduzinho! Coisa mais linda. Tem
5 aninhos – finalmente revela Olga, que estava apenas esperando uma
oportunidade para falar do netinho. – Filho do meu filho Miguelzinho.
– Aquele Miguelzinho
que ficava na barra da sua saia o dia inteiro na época que trabalhávamos no
jornal? – pergunta surpreso Marcos.
– Isso mesmo! Só me dá
alegrias, esse menino. Sempre muito apegado a mim, é verdade. Muito tímido
também, mas é o jeito dele – aponta Olga, com um leve tom de reprovação. E
continua – O filho é a mesma coisa. Apegadíssimo ao pai e a mim. Uma lindeza,
benzadeus!
Enquanto conversam,
uma mulher se aproxima da porta do mercadinho. Usa um vestido azul marinho
bastante justo, sapatos de salto alto, luvas de cetim preto e um chapéu de
renda recaindo sobre o rosto, de pele clara e feição jovial. Ela segura uma
maleta, também azul, e tem o olhar determinado. A mulher então ajeita a roupa,
o cabelo e finalmente adentra o local. Enquanto percorre as fileiras de
vegetais com incomparável elegância e imponência, ela parece observar todas as
pessoas ali dentro com distinta atenção, como uma espiã de guerra, quando
finalmente detecta a presença de Marcos no local. Ela para imediatamente, saca
o pulso esquerdo para olhar as horas e o recolhe novamente, o olhar agora fixo
no homem, que mal sabe que está sendo observado.
– Lembra quando você
pediu demissão do jornal, Olguinha? – pergunta Marcos, mal conseguindo segurar
o riso.
– Oh, como eu me
lembro! Nesse dia a Marlene aproveitou e se demitiu também. Bebemos alguns
drinks em comemoração a nós mesmas – diz a mulher com um ar nostálgico, agora
amarrando a sacola com os tomates e rindo um pouco.
– É verdade, Olguinha.
Todos vibramos muito por você naquele dia. Realmente inesquecível. O Pablo
subiu na mesa e quase foi demitido, lembra? – disse Marcos, suas palavras ainda
competindo com as risadas.
– Mas é claro! Como eu
me esqueceria? – ela diz, com a mão na cintura – Pablo era muito meu amigo.
Viajamos juntos para Bariloche uma vez. Não sei por que paramos de nos falar –
Olga olha para cima como tentando se lembrar.
– Mas me diz,
Olguinha. Tá bonita! Alguma ocasião especial? – ele dispara.
– Sim! Sim, é o
aniversário do Miguelzinho hoje. Eu ainda não tinha te contado? – responde com
muita empolgação ela. – Faremos juntos um peixe ensopado com tomates, como todo
ano – e balança às vistas de Marcos a sacola de tomates.
– Que maravilha,
Olguinha. Muito bom ouvir isso.
A mulher que os
observava agora está fazendo uma ligação telefônica pelo celular, sempre
fitando Marcos à distância. Ela fecha o aparelho, o guarda em sua pequena bolsa
a tiracolo e caminha na direção de Olga e Marcos. Seu andar é o de uma modelo e
seu olhar, o de uma leoa prestes a atacar sua presa.
– Mas me diz, Marcos.
O que você tem feito durante todos esses anos? – pergunta com empolgação Olga.
– Bom, eu –
– Marcos Friedman. – o
interrompe a mulher misteriosa ao se aproximar dos dois.
– Valkíria? Não
acredito! – exclama Marcos, que se apressa para abraçá-la, mas ela permanece
imóvel, com uma expressão de impaciência.
– Valkíria, irmã da
Bertinha? – pergunta Olga, muito surpresa.
– Sim, sou eu. – a
mulher pronuncia as três palavras como se fossem uma única, sem ao menos olhar
para Olga. Seu olhar está fixo em Marcos. E ela continua.
– Acredito que tenha
conhecido o Marcos. – Ela diz, ainda fitando o homem no rosto.
– Sim, ele é o –
– Este homem é
procurado pela KGB por atentados à humanidade. Agora que o encontrei, poderei
tomar as devidas providências. – Valkíria informa, quase de forma robótica.
– Quem? O Marcos? Um
terrorista? Você só pode estar brincando – diz entre risadas Olga.
– Sim. Ele mesmo. Ele
é acusado de ter detonado uma bomba numa escola primária em Minsk, na
Bielorrússia, no mês passado. – Ela diz, sem a menor alteração no tom de sua
voz.
– E o que você vai
fazer? Me prender? – desafia Marcos, visivelmente abalado.
– Esse é o plano.
Contarei com a ajuda do Alberto para isso. – Revela a mulher, e vira a cabeça
para mirar o gerente.
Seu Alberto Shmidt, o
gerente do mercadinho, é um rapaz baixo e de rosto muiro alegre de quem ama seu
trabalho. Suas calças pretas e camisa social branca dobrada à altura dos
cotovelos, assim como o walkie-talkie preso ao cinto, condizem
inteiramente com aquele cargo, que orgulhosamente ocupava há tantos anos
naquele mercadinho. Ao terminar de ajudar uma cliente a encontrar os cestos
para compras, ele repara a mulher acenando para que ele se aproxime e
imediatamente sente-se um tanto quanto intimidado, pois não tinha contato com
mulheres tão atraentes com frequência. Ele então endireita a coluna, dá um
pigarro para limpar a garganta e passa a mão no cabelo de súbito, numa
tentativa de estar em sua melhor forma possível para executar a missão
requisitada pela mulher, que certamente não era qualquer cliente. Ele
então dirige-se até ela.
– Pois não, senhorita.
Posso ajudá-la em algo? – ele pergunta e dá uma piscadinha nada discreta para
Valkíria.
– Pode sim. – Ela responde.
– Já está na hora.
– Ah, sim. Já está
tudo pronto, Srta. Valkíria – informa Alberto, tentando esconder seu nervosismo
evidente.
– Excelente. – E
vira-se para Olga. – Pode ficar de olho nele para mim, Olguinha? – diz Valkíria
olhando pela primeira vez para Dona Olga, no que estava longe de ser um pedido,
mas sim uma ordem.
Antes que Dona Olga
pudesse responder, a mulher vira-se e começa a caminhar em direção à saída do
mercadinho. Seu Alberto a segue prontamente, tentando despedir-se, de forma
muito atrapalhada, de Olga e Marcos.
– Isso está me
cheirando muito mal, Marcos – sussurra Dona Olga para o homem, que a essa
altura não está mais prestando atenção nela, preocupado com outros assuntos.
Seu Alberto conversa
sobre algo Valkíria ao chegar à saída do mercadinho, onde ela já estava,
olhando ocasionalmente para D. Olga e Marcos. Após muitos acenos por parte
dele, Alberto retorna ao seu posto, perto dos caixas do local, enquanto
Valkíria permanece no mesmo lugar.
– Eu sou velha
conhecida do seu Alberto, Marcos. Vou tirar isso a limpo – informa Olga a ele –
Você fique aqui, não quero que nada aconteça com você – pede a mulher,
segurando de leve o ombro de Marcos enquanto deixa sua companhia em
direção a Alberto. Ela então segue até ele, que agora está pálido e suando
demasiadamente.
– Olá, Albertinho –
Olga o cumprimenta, com uma expressão que mistura afeição e desconfiança. –
Posso parecer intrometida, mas o que aquela mulher falou pra você? Vocês têm
algum plano? – inquere.
– Olá, Dona Olga.
Algum problema com as compras? – Ele pergunta, como se não tivesse ouvido D.
Olga. – Ah! Já viu que estamos com uma promoção nas cenouras? Pela metade do
preço! O caqui também está em promoção! Eu, se fosse a senhora, aproveitaria –
e dá uma risada de leve, o suor ainda correndo pelo rosto de pele parda. Ao
perceber a evasão do assunto, Olga despede-se de Alberto com um sorriso e ruma
em direção à mulher elegante atrás de respostas. Antes disso, porém, Alberto
segura-lhe o braço e fala muito baixo, num sussurro:
– Seu filho está em
perigo, dona Olga. Isso é tudo que posso dizer – Ele alerta, trêmulo – Eu
realmente não posso falar mais nada sobe isso, mas talvez a srta. Valkíria
possa – E, olhando timidamente para o chão, solta o braço de dona Olga, não
sabendo como conseguiu fazer algo que ele consideraria tão ousado.
Dona Olga o olha
com se estivesse vendo a morte em pessoa. Após alguns segundos, ela ruma
abruptamente e sem dizer nada em direção à mulher misteriosa atrás de
esclarecimentos. Valkíria está na porta do mercado, expelindo, para o alto,
fumaça da boca, proveniente do cigarro preso a uma piteira, que segura com
elegância ao lado do corpo. Ela não está mais com a maleta. Olga anda até ela,
mas um susto faz com que ela pare de súbito. Há muita gritaria e tumulto do
lado de fora do mercadinho. Após alguns segundos de gritaria e corre-corre das
pessoas na rua, para todos os lados, três homens adentram o local, todos
encapuzados. Dois deles estão com espingardas e um deles, com um facão corroído
por ferrugem. Dona Olga permanece imóvel, os olhos arregalados, e dá um pulo
quando eles cortam aquele silêncio de repente.
– Todos quietos! Agora
nós somos os donos desse local! Se vocês não ficarem quietinhos, a gente vai
botar pra quebrar! – anuncia um dos três bandidos, apoiando a carabina sobre o
ombro. E continua – Eu e meus amigos aqui fomos informados de que há uma tal
Dona Olga neste estabelecimento. Quanto antes ela se apresentar, melhor para
todos – ameaça.
Dona Olga olha para o
gerente, que olha para ela de volta. Ele agora possui uma expressão muito mais
tranquila do que antes, quase como se nada estivesse acontecendo. A mulher não
sabe o que fazer e, aos poucos, começa a recuar, de costas, em direção ao local
em que conversava momentos antes com Marcos. Porém, para sua surpresa, ele não
está mais lá ou em qualquer outro ponto do mercadinho.
– Valkíria, venha cá –
ordena o bandido à mulher elegante, que manteve-se absolutamente tranquila
durante todo o tempo. Ela apaga o cigarro com o sapato e segue em direção ao
bandido, que parecia ser o líder do bando.
– O Miguelzinho,
Valkíria. Eu sei que a mãe dele está aqui, mas quem a gente quer é o filho dela.
– Miguelzinho está em
casa. – diz a mulher, com sua constante cara de desprezo e nojo.
– Bom, e onde diabos
fica essa casa, Valkíria? – replica o bandido, sua paciência aos poucos se
esgotando. Ao ouvir tudo isso, Dona Olga entra em completo desespero. O que
poderiam aqueles homens querer com seu filho? – Um garoto tão bom e certo,
nunca fez mal a ninguém! Ele nunca estaria envolvido com bandidagem! – ela
pensava nervosamente. É somente um tiro que interrompe seus pensamentos
desesperados. O bandido havia matado Valkíria com um tiro na barriga e agora
estava acenando para seus comparsas para que o acompanhassem em direção ao
interior do mercadinho. Eles param ao lado dos caixas e o líder novamente se
pronuncia:
– Dona Olga, nós
sabemos sobre seu filho. Hoje é aniversário dele, né? Dê a ele meus parabéns. –
diz o bandido, virando-se para olhar para seus comparsas com um sorriso
demoníaco. – Mas hoje é o último dia de vida dele, porque nós o apagaremos da
face da Terra – o bandido fala em tom calmo, ao contrário do que se pudesse
esperar daquela situação. Ele olha para todas as pessoas no local, tentando
identificar a mulher que buscavam. E prossegue. – O filho dele, Eduardo, o
Duduzinho! de 5 anos. Seu neto, dona Olga. Nós o mataremos também. Que tal?
Gostou da ideia? – termina, agora rindo muito alto com seus comparsas. Olga
finalmente quebra o silêncio.
– Estou aqui! Eu sou a
Olga e vocês podem acabar com a minha raça, mas deixem meu filho e meu neto em
paz, seus cachorros! Animais! – ela brada, olhando ao redor em busca de algo
para se defender, muito trêmula. Os bandidos então começam a avançar em sua
direção. O do facão aproveita a oportunidade para degolar Alberto com um único
golpe no pescoço, que cai imediatamente. Os outros dois continuam em direção a
Dona Olga, que agora empunhava um rodo azul que encontrara perto da porta da
área de serviço. Os bandidos agora estão perigosamente próximos de Dona Olga.
– Vocês não podem
fazer isso! Eu vou acabar com a vida de vocês! Eu vou matar um por um! Aí eu
quero ver como a mãe de vocês vai se sentir! Seus vermes, seus animais! – ela
grita com a voz trêmula, fazendo movimentos com a vassoura tão fortes e rápidos
quanto a idade permite. Ela para por um instante, o olhar fixo no nada. Então
volta a mirar os bandidos e grita – E quem está balançando essas chaves? Estou
ouvindo barulho de chaves! O que vocês tão tentando abrir? Hein? – e sacode
furiosamente o rodo azul em todas as direções. Então, uma porta se abre sem que
dona Olga perceba.
– Pra trás, seus
bandidos imundos! Ou eu mato todos vocês, eu juro! – os olhos de dona Olga
expressam profundo desespero.
– Mãe! – grita uma voz
familiar.
– É você,
Miguelzinho?! Se afaste! Esses homens querem te matar, e o Duduzinho também!
Pra trás que eu já vou acabar com eles! Pra trás! PRA TRÁS! – grita a senhora,
sem desviar o olhar dos bandidos em nenhum momento; estes, já apontando para
ela e o filho as espingardas.
– Mãe – diz
Fernandinho, colocando a mão no ombro da mãe – se acalme.
– Me acalmar como,
Miguelzinho? Esses homens vão te dar um tiro! Um tiro, meu filho! Eu não vou
deixar! – e balança mais uma vez o rodo.
Miguel quase tropeça
nos tomates no chão da cozinha enquanto tenta se apoderar do rodo que a mãe
sacode para todos os lados.
– Mãe, tá tudo bem. Se
acalme. Eu já cheguei – diz o filho com muita calma, como quem já havia dito
isso centenas de vezes antes. Ele agarra com muito cuidado o rodo da mão da mãe
e o coloca em pé junto ao fogão, que está com os botões removidos para que o
gás não possa ser ligado pela idosa em sua ausência.
– Meu filho, eles iam
te matar! Eu tinha que fazer alguma coisa! – diz Olga com lágrimas nos olhos.
– Tudo bem, mãe. Tá
tudo bem – diz Miguelzinho fazendo carinho na cabeça da mãe, que agora tem
junto ao peito. E termina – Ei, que tal você descansar um pouco agora e mais
tarde a gente faz aquele peixinho ensopado que nós adoramos fazer juntos? –
sugere o filho, olhando nos olhos, ainda chorosos, da mãe.
– Mas e os bandidos,
Miguelzinho? Eles falaram que vão matar você e o Duduzinho – ela inquere, o tom
de voz ainda um pouco exasperado.
– Eles já foram
embora, mãe. Fica tranquila – Ele responde e em seguida se abaixa para recolher
uma maleta azul que a mãe havia jogado no chão da sala. Ao lado dela estava a
foto de um homem de terno, que ele não reconheceu.
Ele então conduz a mãe
até seu quarto, esta agora falando sobre o assassinato frio da mulher elegante
e do Albertinho do mercadinho, enquanto o filho ouve tudo com naturalidade. Ele
deita a mãe em sua cama, a cobre com o lençol e lhe dá um beijo na testa.
– Traz o Duduzinho pra
eu ver ele, meu filho – diz enquanto segura a mão de Miguel – Eu tô morrendo de
saudades dele.
– Claro, mãe. Claro –
diz Miguel, desejando muito que o filho Eduardo ainda estivesse vivo, como na
mente de sua velha mãe. Ele se vira, apaga o abajur da mesa de cabeceira e
fecha a porta ao sair, suspirante.